12 de maio de 2010

Herói politicamente incorreto

Por Thayná Faria e Wanessa Fagundes



Herói por acidente, comédia dirigida por Stephen Frears, é mais ou menos o que o próprio título diz: um homem que, por força do destino, se encontrava na hora e no local certos para salvar as vidas de 54 pessoas que sofreram um acidente de avião.

Bernard - ou 'Bernie' - La Plante (Dustin Hoffman) é um tipo de vagabundo sem perspectivas que vive dando golpes para levantar algum dinheiro, porém acaba sendo pego e corre o risco de ir para a prisão. Aconselhado por sua inexperiente advogada recém formada, após o julgamento e uma iminente condeção, La Plante tenta passar a imagem de bom homem vítimado pelas circunstâncias e para isso tem que se reaproximar de seu filho Joey, um menino de 10 anos que alimenta ilusões heróicas sobre o pai.

Certo dia, enquanto Bernie está a caminho da casa de Joey, algo pouco provável acontece: um avião com passageiros cai à sua frente no meio da estrada. Meio atordoado, La Plante vai até o local e constata que os passageiros estão vivos, mas presos dentro do avião em chamas. Relutante, ele tenta abrir a porta para que as pessoas simplesmente saiam, mas acaba se envolvendo em um resgate que acaba se tornando um acontecimento histórico. A forma como Bernie reage diante da situação é engraçada, visto que diante da situação caótica sua maior preocupação era encontrar seu sapato perdido na confusão. Entre as 54 pessoas salvas, estava a repórter Gale Gayley (Geena Davis), que, por ser extremamente conhecida e influente, após ser salva, se empenha em apurar - e claro, publicar - os fatos e encontrar seu herói.

Após o acidente, Bernie se atrasou mais uma vez, decepcionou o filho e foi ainda desacreditado pela ex-esposa que o põe para fora. Apenas John Bubber (Andy Garcia), um amigo sem teto, acredita em sua história e tenta fazer com que La Plante se apresente e conte à população e à imprensa o que aconteceu. Porém, Bernie, que não é exatamente uma pessoa má, mas tem um “que” de mesquinho e egoísta, tem como lema segundo ele próprio a “discrição” e se recusa ir à publico, contrariando todas as espectativas que neste momento levam a crer que La Plante se aproveitaria da situação para obter alguma vantagem. A história muda de figura quando o canal de TV onde Gale trabalha oferece U$$ 1 milhão para que o herói desconhecido apareça, e Bubber assume o lugar de La Plante, que fica enfurecido.

O filme utiliza uma forma de apresentação dos personagens claramente calcada em estereótipos. Tal ação pode ser constatada a partir do jeito vagabundo do personagem principal, dos lugares que ele frequênta, no filho ansioso por um pai presente, na ex esposa histérica e preocupada, e principalmente nos personagens do meio jornalístico. Gale Gayley, assim como toda equipe jornalística do canal 4, por vezes têm atitudes anti-éticas em relação ao exercício de sua profissão ignorando fatores ético-sociais, tais como as dificuldades diversas, desde as de cunho econômico até o sensível estado psicológico do ser humano envolvido em suas reportagens, preocupando-se somente com o sucesso e a grande repercussão da matéria. Somente após um envolvimento pessoal com seu suposto salvador surge uma espécie de crise de consciência.

Por fim, permanece o drama: todos saberão afinal a identidade do verdadeiro herói ou continuarão acreditando na versão falsa, porém mais convincente? Com o decorrer do filme o drama de Bernie, ao mesmo tempo que sensibiliza o espectador pela injustiça cometida contra ele é relevante em comparação à conduta de Bubber, que se comporta como um verdadeiro herói – a não ser pelo fato de ter usurpado o lugar do “amigo” – apoiando doentes, sem teto e outros necessitados.

Com um roteiro divertido, “Herói por acidente” é um filme inteligente que aborda dentre todas essas questões morais e outras ligadas também à imprensa e a manipulação que esta exerce sobre o imaginário popular.



Um comentário: