27 de abril de 2010

Um grande circo mortal

Por Marcos Paulo e Michele Santana


Billy Wilder, brilhante cineasta, desenvolve uma forte crítica ao poder nefasto do jornalismo na vida das pessoas. No filme A Montanha dos Sete Abutres (do inglês Ace in the Hole, Hollywood, Paramount, 1951), é contada a história de Charles Tatum, um jornalista interpretado por Kirk Douglas, que utiliza o jornalismo para promoção pessoal.

Tatum, por ter uma conduta questionável como jornalista, perde diversos empregos em grandes jornais e, tentando recuperar o que perdeu, consegue se empregar no pequeno jornal de uma cidade interiorana chamada Albuquerque.

Depois de dizer ao chefe do jornal que estava desempregado, ele deixa implícito que a sua concepção de jornalismo é edificar fatos com a interferência ilimitada do jornalista. Mas Tatum quer mesmo um grande furo de reportagem que o recoloque nos grandes jornais de Nova York, de onde fora banido por falhas éticas.

Percebe-se aí que Tatum é um homem ganancioso, que não mede esforços para que uma matéria lhe dê status, mesmo que precise mentir ou forjar verdades. E ele mesmo diz que mente para alcançar o que quer e, quando se vê diante do soterramento de Leo Minosa, não pensa duas vezes antes de chegar à conclusão de que aquilo lhe renderia muito mais do que tudo que estava encontrando em Albuquerque desde que lá chegou.

Neste contexto, Tatum conta com a ajuda do fotógrafo Herbie, que antes acreditava na verdade do jornalismo; do xerife Gus Kretzer e da esposa de Leo, que ele consegue manipular para ajudá-lo a refazer seu nome. Desse modo, o soterramento se transforma numa tragédia sensacionalista, pois Tatum faz Leo permanecer preso nas minas da montanha até que o acidente seja noticiado pela grande imprensa.

Tatum acaba por transformar o acidente de um indivíduo num grande evento jornalístico. Uma tragédia sensacionalista que mobiliza o público americano que se instala no lugar juntamente com todo um grande aparato circense: parques de diversões, música, lojinhas de souvenir, lanchonetes e barracas abrigando os mais diversos curiosos. “Pão e circo para o povo” frase dita pelo Imperador Romano Vespasiano define bem essa situação. E o mais interessante é que é disso mesmo que o povo gosta e que dá o ibope. O Coliseu se encontra de ante dos nossos olhos.
O filme, produzido na década de 50, mostra em detalhes toda a articulação de um jornalista para tornar um fato espetacular, à base de trapaças e mentiras.
É possível notar na imprensa o quanto alguns profissionais da informação não estão preocupados com a notícia, mas com a autopromoção e, por isso, transformam notícias em mercadorias, apenas mais um produto para ser colocado no mercado e consumido.

Portanto, manipulam-se fatos para tornar a matéria mais atraente para uma população que também está preocupada em apenas consumir e não em se informar, ignorando questões básicas e não questionando a veracidade dos fatos. Tatum é o modelo desse tipo de jornalismo, capaz até mesmo de “morder um cachorro” na falta de notícias.

A Montanha dos Sete Abrutes é uma aula sobre ojornalismo sensacionalista e inescrupuloso, que mostra como algumas condutas, mesmo condenáveis, do ponto de vista ético, se perpetuam.








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